Foi publicada na Iª Série do Diário da República a Lei n.º 4-C/2020 de 6 de abril, que estabelece um regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional, atendendo à situação epidemiológica provocada pela doença COVID-19.
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.o
Objeto
1 — A presente lei estabelece um regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional, atendendo à situação epidemiológica provocada pela doença COVID-19.
2 — O disposto na presente lei é ainda aplicável, com as necessárias adaptações, a outras formas contratuais de exploração de imóveis.
Artigo 2.o
Âmbito territorial
A presente lei é aplicável em todo o território nacional.
CAPÍTULO II
Arrendamento habitacional
Artigo 3.o
Quebra de rendimentos dos arrendatários e senhorios habitacionais
1 — No caso de arrendamentos habitacionais, a presente lei é aplicável quando se verifique:
a) Uma quebra superior a 20 % dos rendimentos do agregado familiar do arrendatário face aos rendimentos do mês anterior ou do período homólogo do ano anterior; e
b) A taxa de esforço do agregado familiar do arrendatário, calculada como percentagem dos rendimentos de todos os membros daquele agregado destinada ao pagamento da renda, seja ou se torne superior a 35 %; ou
c) Uma quebra superior a 20 % dos rendimentos do agregado familiar do senhorio face aos rendimentos do mês anterior ou do período homólogo do ano anterior; e
d) Essa percentagem da quebra de rendimentos seja provocada pelo não pagamento de rendas pelos arrendatários ao abrigo do disposto na presente lei.
2 — A demonstração da quebra de rendimentos é efetuada nos termos de portaria a aprovar pelo membro do Governo responsável pela área da habitação.
Artigo 4.o
Mora do arrendatário habitacional
Nas situações previstas no artigo anterior, o senhorio só tem direito à resolução do contrato de arrendamento, por falta de pagamento das rendas vencidas nos meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, se o arrendatário não efetuar o seu pagamento, no prazo de 12 meses contados do termo desse período, em prestações mensais não inferiores a um duodécimo do montante total, pagas juntamente com a renda de cada mês.
Artigo 5.o
Apoio financeiro
1 — Os arrendatários habitacionais, bem como, no caso dos estudantes que não aufiram rendimentos do trabalho, os respetivos fiadores, que tenham, comprovadamente a quebra referida no artigo 3.o, e se vejam incapacitados de pagar a renda das habitações que constituem a sua residência permanente ou, no caso de estudantes, que constituem residência por frequência de estabelecimentos de ensino localizado a uma distância superior a 50 km da residência permanente do agregado familiar, podem solicitar ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, I. P. (IHRU, I. P.), a concessão de um empréstimo sem juros para suportar a diferença entre o valor da renda mensal devida e o valor resultante da aplicação ao rendimento do agregado familiar de uma taxa de esforço máxima de 35 %, de forma a permitir o pagamento da renda devida, não podendo o rendimento disponível restante do agregado ser inferior ao indexante dos apoios sociais (IAS).
2 — O disposto no número anterior não é aplicável aos arrendatários habitacionais, cuja quebra de rendimentos determine a redução do valor das rendas por eles devidas, nos termos estabeleci- dos em regimes especiais de arrendamento ou de renda, como o arrendamento apoiado, a renda apoiada e a renda social.
3 — Os senhorios habitacionais que tenham, comprovadamente, a quebra de rendimentos referida na alínea c) do n.o 1 do artigo 3.o, cujos arrendatários não recorram a empréstimo do IHRU, I. P., nos termos dos números anteriores, podem solicitar ao IHRU, I. P., a concessão de um empréstimo sem juros para compensar o valor da renda mensal, devida e não paga, sempre que o rendimento disponível restante do agregado desça, por tal razão, abaixo do IAS.
4 — Os empréstimos a que se referem os n.os 1 e 3 são concedidos pelo IHRU, I. P., ao abrigo das suas atribuições, em particular da competência prevista na alínea k) do n.o 2 do artigo 3.o do Decreto-Lei n.o 175/2012, de 2 de agosto, na sua redação atual, e têm, como primeiras fontes de financiamento, as verbas inscritas no seu orçamento para 2020 provenientes da consignação de receita de impostos sobre o rendimento e, se necessário, das verbas a transferir para o IHRU, I. P., pela Direção-Geral do Tesouro e Finanças no âmbito de políticas de promoção de habitação, fi- nanciadas por receitas de impostos inscritas no capítulo 60, ambas nos termos previstos no Orça- mento do Estado para 2020, aprovado pela Lei n.o 2/2020, de 31 de março, bem como nos saldos transitados do Programa SOLARH, criado pelo Decreto-Lei n.o 39/2001, de 9 de fevereiro, na sua redação atual.
5 — O regulamento a ser elaborado pelo IHRU, I. P., com as condições de concessão dos empréstimos referidos nos números anteriores, atendendo à urgência e ao seu especial fim, produz todos os seus efeitos a contar da data da sua divulgação no Portal da Habitação, na sequência de aprovação pelo conselho diretivo do IHRU, I. P., sujeita a homologação do membro do Governo responsável pela área da habitação.
Artigo 6.o
Deveres de informação
1 — Os arrendatários que se vejam impossibilitados do pagamento da renda têm o dever de informar o senhorio, por escrito, até cinco dias antes do vencimento da primeira renda em que pretendem beneficiar do regime previsto no presente capítulo, juntando a documentação comprovativa da situação, nos termos da portaria a que se refere o n.o 2 do artigo 3.o
2 — O disposto no número anterior não se aplica às rendas que se vençam na data prevista no artigo 14.o, podendo em tal caso a notificação ser feita até 20 dias após a data de entrada em vigor da presente lei.
CAPÍTULO III
Arrendamento não habitacional
Artigo 7.o
Quebra de rendimentos dos arrendatários não habitacionais
O presente capítulo aplica-se:
a) Aos estabelecimentos abertos ao público destinados a atividades de comércio a retalho e de prestação de serviços encerrados ou que tenham as respetivas atividades suspensas ao abrigo do Decreto n.o 2-A/2020, de 20 de março, ou por determinação legislativa ou administrativa, nos termos previstos no Decreto-Lei n.o 10-A/2020, de 13 de março, na sua redação atual, ou ao abrigo da Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada pela Lei n.o 27/2006, de 3 de julho, na sua redação atual, da Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.o 95/2019, de 4 de setembro, ou de outras disposições destinadas à execução do estado de emergência, incluindo nos casos em que estes mantenham a prestação de atividades de comércio eletrónico, ou de prestação de serviços à dis- tância ou através de plataforma eletrónica;
b) Aos estabelecimentos de restauração e similares, incluindo nos casos em que estes mantenham atividade para efeitos exclusivos de confeção destinada a consumo fora do estabelecimento ou entrega no domicílio, nos termos previstos no Decreto n.o 2-A/2020, de 20 de março, ou em qualquer outra disposição que o permita.
Artigo 8.o
Diferimento de rendas de contratos de arrendamento não habitacionais
O arrendatário que preencha o disposto no artigo anterior pode diferir o pagamento das rendas vencidas nos meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, para os 12 meses posteriores ao término desse período, em prestações mensais não inferiores a um duodécimo do montante total, pagas juntamente com a renda do mês em causa.
Artigo 9.o
Cessação do contrato ou outras penalidades
1 — A falta de pagamento das rendas que se vençam nos meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, nos termos do artigo anterior, não pode ser invocada como fundamento de resolução, denúncia ou outra forma de extinção de contratos, nem como fundamento de obrigação de desocupação de imóveis.
2 — Aos arrendatários abrangidos pelo artigo 7.o não é exigível o pagamento de quaisquer outras penalidades que tenham por base a mora no pagamento de rendas que se vençam nos termos do número anterior.
Artigo 10.o
Cessação do contrato ou outras penalidades
O disposto no presente capítulo aplica-se, com as necessárias adaptações, a outras formas contratuais de exploração de imóveis para fins comerciais.
CAPÍTULO IV
Entidades públicas
Artigo 11.o
Suspensão, redução ou isenção de renda devidas a entidades públicas
1 — Sem prejuízo do disposto nos artigos anteriores, as entidades públicas com imóveis arrendados ou cedidos sob outra forma contratual podem, durante o período de vigência da presente lei, reduzir as rendas aos arrendatários que tenham, comprovadamente, uma quebra de rendimentos superior a 20 % face aos rendimentos do mês anterior ou do período homólogo do ano anterior, quando da mesma resulte uma taxa de esforço superior a 35 % relativamente à renda.
2 — O disposto no número anterior não se aplica àqueles que sejam beneficiários de regimes especiais de arrendamento habitacional ou de renda, como o arrendamento apoiado, a renda apoiada e a renda social.
3 — As entidades públicas com imóveis arrendados ou cedidos sob outra forma contratual podem isentar do pagamento de renda os seus arrendatários que comprovem ter deixado de auferir quaisquer rendimentos após 1 de março de 2020.
4 — As entidades públicas com imóveis arrendados ou cedidos sob outra forma contratual podem estabelecer moratórias aos seus arrendatários.
CAPÍTULO V
Disposições complementares
Artigo 12.o
Indemnização
1 — A indemnização prevista no n.o 1 do artigo 1041.o do Código Civil, por atraso no pagamento de rendas que se vençam nos meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, não é exigível sempre que se verifique o disposto nos artigos 4.o e 7.o da presente lei.
2 — O disposto no n.o 3 do artigo 1041.o do Código Civil não é aplicável durante o período de aplicação da presente lei.
Artigo 13.o
Vencimento imediato
A cessação do contrato por iniciativa do arrendatário torna exigível, a partir da data da cessação, o pagamento imediato das rendas vencidas e não pagas, nos termos da presente lei.
CAPÍTULO VI
Disposições finais e transitórias
Artigo 14.o
Aplicação da lei no tempo
A presente lei é aplicável às rendas que se vençam a partir do dia 1 de abril de 2020.
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Este diploma poderá ser consultado no seguinte link: Lei n.º 4-C/2020