Foi publicado em Diário da República, Série I, n.º 64/2020, de 2020-03-31, a LEI N.º 3/2020 - GRANDES OPÇÕES DO PLANO PARA 2020, que integram as medidas de política e os investimentos que as permitem concretizar.
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Artigo 3.º
Grandes Opções do Plano
1 - As Grandes Opções do Plano para 2020-2023 integram o seguinte conjunto de compromissos e de políticas em torno de quatro agendas estratégicas:
a) Alterações climáticas e valorização dos recursos;
b) Sustentabilidade demográfica e melhor emprego;
c) Menos desigualdades e um território mais coeso;
d) Transição digital e uma sociedade da inovação.
2 - As Grandes Opções do Plano para 2020-2023 integram ainda compromissos e políticas nos seguintes domínios transversais de intervenção:
a) Valorização das funções de soberania;
b) No aperfeiçoamento da qualidade da democracia;
c) Política orçamental estável e credível;
d) Na melhoria da qualidade dos serviços públicos e das infraestruturas.
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GOVERNAÇÃO E SERVIÇOS PÚBLICOS
Investir na qualidade dos serviços públicos
Para fortalecer a Administração Pública enquanto elemento essencial da prestação de melhores serviços públicos, uma das prioridades é implementar políticas de gestão de recursos humanos, nomeadamente planear o recrutamento em função das necessidades efetivas de cada área da Administração Pública, valorizar os salários e as carreiras técnicas, e implementar políticas ativas de pré-reforma nos setores que o justifiquem.
Para isso, o Governo irá:
. Contribuir para o rejuvenescimento da Administração Pública, através de percursos profissionais com futuro, alteração da política de baixos salários, reposição da atualização anual dos salários e, valorização da remuneração dos trabalhadores de acordo com as suas qualificações e reconhecimento do mérito;
. Aprofundar o atual modelo de recrutamento e seleção de dirigentes superiores e intermédios, através da Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP), garantindo a transparência, o mérito e a igualdade de oportunidades, tendo por base um plano de ação para os serviços a que se candidatam e a constituição de equipas com vista à criação de uma nova geração de dirigentes públicos qualificados e profissionais, cujos resultados sejam avaliados periodicamente, com efeito na duração da comissão de serviço;
. Adotar medidas de responsabilização e valorização dos dirigentes superiores e dos dirigentes intermédios da Administração Pública, evitando a excessiva concentração da competência para decidir nos graus mais elevados das hierarquias;
. Estabelecer percursos formativos que incluam capacitação para a liderança em contexto público e liderança de equipas com autonomia reforçada;
. Reativar a avaliação dos serviços com distinção de mérito associada aos melhores níveis de desempenho e refletir essa distinção em benefícios para os respetivos trabalhadores, garantindo, assim, o alinhamento das dimensões individual e organizacional;
. Simplificar e anualizar o sistema de avaliação de desempenho dos trabalhadores, garantindo que os objetivos fixados no âmbito do sistema de avaliação de trabalhadores da Administração Pública sejam prioritariamente direcionados para a prestação de serviços ao cidadão;
. Investir em novos incentivos à eficiência e à inovação para os trabalhadores, estimulando o trabalho em equipa e aprofundando o envolvimento nos modelos de gestão dos serviços;
. Implementar políticas ativas de pré-reforma nos setores e funções que o justifiquem, contribuindo para o rejuvenescimento dos mapas de pessoal e do efetivo;
. Concluir a revisão das carreiras não revistas, para harmonizar regimes, garantir a equidade e a sustentabilidade, assegurando percursos profissionais assentes no mérito dos trabalhadores;
. Incentivar percursos dinâmicos de aprendizagem, que conjuguem formação de longa e de curta duração, tirando partido dos meios digitais para facilitar o acesso dos trabalhadores às competências necessárias aos seus percursos profissionais;
. Apostar na implementação generalizada de programas de bem-estar no trabalho, que promovam a conciliação entre a vida pessoal, familiar e profissional;
. Estabelecer novas formas de diálogo social que permitam definir modelos, instrumentos e regimes que garantam uma transição responsável para o futuro do trabalho, considerando os desafios para os trabalhadores e os empregadores públicos que decorrem em particular da demografia e da transição para a sociedade digital.
Aprofundar o trabalho colaborativo e acelerar a criação de centros de competências.
Uma das prioridades para modernizar a Administração Pública é a consolidação dos modelos de gestão transversal de trabalhadores, nomeadamente em centros de competências ou em redes colaborativas temáticas. Depois da criação de dois centros de competências (jurídicas e informáticas) pretende-se prosseguir este objetivo, através de ações para:
. Consolidar, ampliar e diversificar os centros de competências, associando a estes uma dimensão criadora de conhecimento acessível em toda a Administração Pública;
. Desenvolver novos modelos de gestão transversal de trabalhadores, nomeadamente em redes colaborativas temáticas, tirando partido das tecnologias e da transformação digital, sem obrigar a alterações estruturais;
. Instituir modelos de trabalho colaborativo nas áreas financeira, de gestão e de recursos humanos, para que os trabalhadores funcionem em rede e em articulação direta com a área governativa das finanças ou da modernização do estado e da administração pública, quer para o apoio técnico, quer para o reforço das respetivas competências profissionais;
. Aprofundar a gestão estratégica de recursos humanos, planeando o recrutamento global com caráter plurianual, recorrendo a bolsas de recrutamento, em função das necessidades de cada área governativa, considerando as transformações e o desenvolvimento expectável das missões dos serviços.
Melhorar a qualidade do atendimento.
O bom atendimento nos serviços públicos deve ser encarado como um verdadeiro direito. Deve ser prestado um atendimento de qualidade, rápido, cordato e que resolva efetivamente os problemas, mesmo que envolva vários serviços públicos. Para isso, é preciso criar condições para que o utente seja encaminhado para o balcão presencial, telefónico ou online que, de forma mais acessível, célere e cómoda, permita realizar o serviço público pretendido. Para este efeito, o Governo propõe:
. Garantir a simplificação e o acesso multicanal, designadamente na Internet, por via telefónica e presencial, pelo menos aos 25 serviços administrativos mais solicitados;
. Gerir, de forma integrada, o atendimento nos serviços públicos, independentemente do departamento do Estado que o preste, com a criação de uma unidade que, de forma permanente, organize o atendimento público nos serviços mais críticos, defina e corrija procedimentos, defina níveis de serviço para o atendimento, monitorize o serviço, antecipe constrangimentos e adote soluções para a promoção constante da melhoria no atendimento destes serviços públicos;
. Capacitar os trabalhadores que fazem atendimento ao público, através de formação específica para o atendimento, formação contínua sobre sistemas de informação e incentivos associados ao volume de atendimento;
. Melhorar o funcionamento dos Espaços Cidadão, adaptando-os às necessidades dos utentes, designadamente reformulando o catálogo de serviços, para que estas estruturas de atendimento presencial de proximidade prestem os serviços mais procurados de entre os disponibilizados pela Administração Pública;
. Desenvolver o Mapa Cidadão, disponível no Portal ePortugal, para que este disponibilize informação e encaminhe os utentes para os canais de atendimento mais adequados ao serviço procurado, garantindo qualidade, proximidade e celeridade no atendimento, possibilitando ainda o agendamento de serviços ou a emissão de senha eletrónica;
. Disponibilizar um número de telefone único, curto e facilmente memorizável que funcione quer como porta de entrada e encaminhamento do cidadão para serviços da Administração Pública, quer como canal de prestação dos serviços solicitados com mais frequência;
. Recorrer a ferramentas de inteligência artificial para equilibrar a procura e a oferta de serviços públicos, sendo implementados mecanismos de simulação para avaliar a eficiência e os impactos do atendimento, num determinado momento, e propor soluções de melhoria.
Melhorar a qualidade da democracia e combate à corrupção
Nas últimas décadas foram introduzidas várias reformas de abertura do sistema político, designadamente com a apresentação de candidaturas independentes, a introdução da paridade nas listas para as eleições autárquicas, legislativas e europeias e a limitação de mandatos autárquicos, a par de medidas de combate à corrupção e pela transparência.
O Governo vai dar continuidade a este caminho, melhorando a qualidade da democracia, com a participação dos cidadãos, renovando e qualificando a classe política, aproximando a legislação dos seus destinatários, protegendo os direitos e liberdades fundamentais investindo numa efetiva educação para a cidadania, e promovendo uma estratégia transversal e integrada de combate à corrupção, compreendendo a prevenção e a repressão.
Melhorar a qualidade da legislação
A qualidade da legislação e a garantia do seu cumprimento são essenciais para a melhoria global do sistema político e um fator determinante na qualidade do serviço público, aspetos essenciais para a melhoria da atividade económica, em particular, na atração do investimento e melhoria da competitividade. Através do programa «Legislar Melhor» existiram melhorias na produção de leis mais simples, atempadas, eficazes, participadas, facilmente acessíveis e sem encargos excessivos. O Governo pretende dar continuidade a estas ações, pelo que irá:
. Prosseguir a política de contenção legislativa e de revogação de decretos-leis antigos e já obsoletos;
. Promover exercícios de codificação legislativa, eliminando legislação dispersa;
. Aprovar e divulgar, todos os anos, um plano de trabalho legislativo, com a calendarização das principais iniciativas legislativas do Governo, à semelhança do que faz a Comissão Europeia;
. Acelerar o processo de conclusão de tratados e acordos internacionais, especialmente quando estejam em causa matérias com impacto positivo nos planos económico ou social;
. Garantir que, quando o Conselho de Ministros aprova um diploma, a respetiva regulamentação já está pronta e controlar o cumprimento dos prazos de regulamentação através de um sistema eletrónico, com alertas automáticos, que seja interoperável com a Assembleia da República, com relatórios públicos semestrais;
. Aprovar um código de legística comum a todas as instituições com poderes legislativos (Assembleia da República, Governo e Assembleias Legislativas Regionais), mediante acordo entre as entidades envolvidas;
. Completar a desmaterialização do processo legislativo, nomeadamente no que diz respeito à circulação dos diplomas entre órgãos de soberania;
. Alargar a avaliação prévia de impacto legislativo, a fim de estimar e quantificar não só os encargos da legislação aprovada pelo Governo sobre as empresas e os cidadãos, mas também os impactos sobre a própria Administração Pública e os benefícios gerados;
. Garantir um acompanhamento próximo, por parte da Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia (REPER), dos encargos administrativos gerados pela legislação em discussão nas instituições da União Europeia;
. Assegurar a transposição atempada das diretivas europeias;
. Combater as práticas de goldplating, que consiste em acrescentar às exigências da legislação europeia outros procedimentos e formalidades, de âmbito estritamente nacional, que são desnecessários e criam distorções face aos demais Estados-Membros;
. Fazer acompanhar as propostas de lei submetidas à Assembleia da República do respetivo relatório de avaliação de impacto legislativo;
. Consolidar a experiência-piloto de avaliação de impacto legislativo quanto ao combate à pobreza e à corrupção, melhorando procedimentos e critérios, de modo a garantir a relevância e efetividade destes procedimentos;
. Assegurar que todos os decretos-leis e decretos regulamentares continuam a ser publicados juntamente com um resumo, em português e inglês, que explique de forma simples as principais novidades decorrentes com impacto na vida dos cidadãos;
. Assegurar a clareza e inteligibilidade dos sumários dos diplomas publicados no Diário da República, em particular no que diz respeito a portarias;
. Disponibilizar no portal do Diário da República Eletrónico, de forma gratuita, o acesso a um conjunto de recursos jurídicos, desde legislação consolidada e anotada a jurisprudência, incluindo um dicionário e um tradutor de termos jurídicos, com um padrão de serviço equiparável ou superior às bases de dados jurídicas existentes no mercado;
. Estabelecer um programa calendarizado de tradução de diplomas legais para inglês;
. Desenvolver projetos-piloto de conversão de leis em código de programação, permitindo o recurso a ferramentas de machine reading e inteligência artificial para simular e automatizar os efeitos da aplicação dessas leis.
Prevenir e combater a corrupção e a fraude
A par de um ineficiente funcionamento da Administração Pública e do não reconhecimento da qualidade das instituições públicas, a corrupção tem efeitos negativos na confiança dos cidadãos e investidores nas instituições e condiciona fortemente a capacidade de atração de investimento privado, condição essencial ao crescimento económico e social de uma sociedade.
Sendo uma condição essencial para a saúde da democracia e para a afirmação de um Estado transparente, justo e equitativo, o Governo pretende dar continuidade às ações que têm vindo a ser empreendidas e adotar uma abordagem integrada no combate e prevenção da corrupção, tanto o setor público como o setor privado.
Serão empreendidas ações a montante, prevenindo os contextos geradores de corrupção, designadamente eliminando os bloqueios ou entraves burocráticos, mas também será necessário capacitar o sistema com uma compreensão completa do fenómeno, reunindo dados que permitam definir indicadores de risco, corrigir más práticas e concentrar a investigação nos principais focos de incidência da corrupção.
Para atingir estes objetivos, o Governo irá:
. Instituir o relatório nacional anticorrupção, que permita construir um panorama geral e o desenvolvimento e avaliação de um conjunto de medidas sobre a matéria;
. Estabelecer que, de 3 em 3 anos, no âmbito dos relatórios de política criminal, a Procuradoria-Geral da República deve reportar à Assembleia da República o grau de aproveitamento e aplicação dos mecanismos legalmente existentes no âmbito do combate à corrupção;
. Assegurar uma maior cooperação com o Grupo de Estados contra a Corrupção (GRECO);
. Instituir campanhas de consciencialização para o fenómeno da corrupção, no âmbito da educação para a cidadania, bem como junto das entidades públicas, alertando para os comportamentos que podem indiciar corrupção;
. Consagrar o princípio da «pegada legislativa», estabelecendo o registo obrigatório de qualquer intervenção de entidades externas no processo legislativo, desde a fase de conceção e redação do diploma legal até à sua aprovação final;
. Consolidar e desenvolver a experiência, atualmente em curso, de avaliação da permeabilidade das leis aos riscos de fraude, corrupção e infrações conexas, consagrando a obrigatoriedade de avaliação prévia fundamentada das medidas de política na ótica da prevenção da corrupção;
. Garantir, no âmbito do referido processo de avaliação legislativa, transparência e simplicidade jurídicas dissuasoras de comportamentos administrativos «facilitadores»;
. Prosseguir o programa SIMPLEX, numa perspetiva de promoção da confiança na Administração Pública, eliminando atos burocráticos e barreiras administrativas que possam motivar o fenómeno da corrupção; Adotar, neste programa, uma medida destinada a informar os cidadãos, no momento em que o pedido é apresentado, sobre o prazo em que será tomada a decisão, os responsáveis pela decisão, os serviços envolvidos e o valor a pagar;
. Elaborar e publicitar guias de procedimentos, dirigidos aos cidadãos, sobre os vários serviços prestados pela Administração Pública, identificando os documentos necessários, as fases de apreciação, os prazos de decisão, bem como simuladores de custos relativos aos serviços prestados por cada entidade;
. Obrigar todas as entidades administrativas a aderir a um código de conduta ou a adotar códigos de conduta próprios que promovam a transparência, o rigor e a ética na atuação pública;
. Consagrar o princípio, segundo o qual, qualquer decisão administrativa que conceda uma vantagem económica acima de determinado valor tem de ser assinada por mais do que um titular do órgão competente, ou confirmada por uma entidade superior, e publicitada num portal online;
. Lançar a segunda geração de planos de prevenção de riscos de gestão focados nos resultados e na avaliação, com parâmetros de monitorização estandardizados, capacitando o Conselho de Prevenção da Corrupção;
. Assegurar que, em entidades administrativas onde estejam em causa matérias que exigem especial imparcialidade e transparência ou que lidem com a concessão de benefícios, existe um departamento de controlo interno que, com autonomia, assegure a transparência e imparcialidade dos procedimentos e das decisões;
. Garantir a existência, em todas as entidades públicas, de normas de controlo interno, devidamente publicitadas, que tratem matérias como garantias de imparcialidade e legalidade na contratação ou segurança de inventários, elaboradas de acordo com um modelo de partilha de conhecimentos;
. Aumentar os níveis de cumprimento das obrigações de reporte das várias entidades públicas, e permitir uma análise e tratamento de dados com base na informação já disponibilizada em portais públicos (nomeadamente Base.gov), relativamente a adjudicações excessivas por ajuste direto às mesmas entidades;
. Melhorar os processos de contratação pública, incrementando a transparência e eliminando burocracias, no âmbito dos procedimentos pré-contratuais, que possam conduzir à eliminação de propostas válidas;
. Integrar os sistemas de gestão financeira com os sistemas de inventariação e contratação no âmbito da Administração Direta e Indireta do Estado, disponibilizando estas ferramentas também à Administração Regional e Local;
. Promover uma publicação mais eficiente das contas dos partidos políticos, de forma uniformizada e facilitando o acesso, especialmente no que concerne aos períodos eleitorais;
. Modernizar o registo de interesses dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, permitindo a recolha de mais informação e um melhor cruzamento de dados;
. Aplicar a todos os órgãos de soberania a obrigação de declaração de rendimentos, património e cargos sociais;
. Instituir a obrigação de as médias e grandes empresas disporem de planos de prevenção de riscos de corrupção, fixando os requisitos mínimos a que devem necessariamente obedecer os programas de conformidade das grandes empresas;
. Estabelecer como condição de acesso a concursos para a realização de empreitadas de obras públicas e outros contratos públicos a partir de determinado valor, por parte de grandes empresas, a existência e observância de planos de prevenção de riscos de corrupção;
. Expandir a utilidade do Regime Central do Beneficiário Efetivo (RCBE), passando a ser possível, de forma mais simples, desconsiderar a personalidade jurídica e agir contra o beneficiário efetivo de determinada organização; Simplificar o RCBE, designadamente por via do preenchimento automático da informação declarada com base em informação que resulte do registo comercial;
. Criar uma pena acessória para os titulares de cargos políticos condenados por corrupção, o que, através de decisão judicial, poderá impedir a sua eleição ou nomeação para cargos políticos em caso de condenação pela prática de crimes de corrupção, a decretar judicialmente por um período até 10 anos;
. Rever a lei e atualizar as penas relativas aos crimes de aquisição ilícita de quotas ou ações e de prestação de informações falsas perante quem as sociedades comerciais devem responder, cujas penas máximas são atualmente incipientes;
. Criar uma pena acessória para gerentes e administradores de sociedades que tenham sido condenados por crimes de corrupção, por forma que possa ser decretada judicialmente a sua idoneidade para o exercício dessas funções durante um certo período;
. Responsabilizar as entidades reguladoras, as associações públicas profissionais e outras entidades competentes em determinados setores de atividade pela imposição de medidas adicionais aos setores por si tutelados, promovendo boas práticas em setores como o sistema financeiro, da construção, desportivo e dos serviços públicos essenciais;
. Coligir e divulgar, sem identificação pessoal dos condenados e de forma resumida quanto à factualidade e à aplicação do direito, os casos de corrupção que deram origem a condenações transitadas em julgado em cada triénio.
Aprofundar a descentralização
O processo de descentralização de competências da administração central constitui um fator estruturante na da organização e gestão do Estado e dá cumprimento a objetivos de maior eficácia, eficiência e proximidade das políticas públicas, na medida em que possibilita uma maior adequação dos serviços prestados à população.
Num contexto marcado pela relação de confiança com as autarquias locais, por uma significativa recuperação e crescimento da capacidade financeira dos municípios e freguesias, pela devolução de autonomia ao poder local e pelo maior processo de descentralização de competências das últimas décadas, pretende-se aprofundar o processo de reforma do Estado, estabelecendo uma governação de proximidade baseada no princípio da subsidiariedade.
Neste quadro, as linhas condutoras de ação até 2023 são a elevação da participação local na gestão das receitas públicas até à média da União Europeia, a consolidação do processo de descentralização e o alargamento dos poderes locais a nível infra estadual. Mais capacidade de ação das autarquias locais deverá ser acompanhada pelo reforço dos mecanismos de transparência e de fiscalização democrática das políticas locais.
Democratizar a governação territorial
O Governo irá:
. Consagrar a eleição democrática das direções executivas das cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), por um colégio eleitoral composto pelos membros das câmaras e das assembleias municipais (incluindo os presidentes de junta de freguesia) da respetiva área territorial, com base em listas subscritas pelo mínimo de um décimo dos eleitores, respondendo as direções executivas perante o Conselho Regional;
. Harmonizar as circunscrições territoriais da Administração desconcentrada do Estado e proceder à integração nas CCDR dos serviços desconcentrados de natureza territorial, designadamente nas áreas da educação, saúde, cultura, ordenamento do território, conservação da natureza e florestas, formação profissional e turismo, bem como dos órgãos de gestão dos programas operacionais regionais e demais fundos de natureza territorial, sem prejuízo da descentralização de algumas destas competências para as comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas;
. Atribuir às áreas metropolitanas competências supramunicipais nos respetivos territórios, designadamente nos domínios da mobilidade e transportes (incluindo os operadores de transportes públicos), do ordenamento do território e da gestão de fundos europeus.
Aprofundar a descentralização e a subsidiariedade
O Governo irá:
. Concretizar até 2021 a transferência, para as entidades intermunicipais, municípios e freguesias, das competências previstas nos diplomas setoriais aprovados com base na Lei-Quadro da Descentralização;
. Aprovar até junho de 2021 as novas competências a descentralizar para as entidades intermunicipais, municípios e freguesias no ciclo autárquico 2021-2025, aprofundando as áreas já descentralizadas e identificando novos domínios com base na avaliação feita pela Comissão de Acompanhamento da Descentralização e em diálogo com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e com a Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE);
. Desenvolver estruturas de apoio técnico partilhado, a nível intermunicipal, para apoio ao exercício de novas competências pelos municípios e freguesias;
. Criar projetos-piloto de gestão descentralizada nas áreas da educação, da saúde, do desenvolvimento rural, das políticas sociais e da formação profissional;
. Dotar todas as freguesias de condições para o exercício de novas competências, designadamente admitindo a possibilidade de contarem sempre com um membro exercendo funções a tempo parcial;
. Aprovar os critérios de criação e agregação de autarquias locais, prevendo a participação obrigatória dos órgãos das autarquias abrangidas e garantindo a estabilidade territorial mínima ao longo de três mandatos.
Reforçar a transparência na governação local
O Governo irá:
. Possibilitar a realização de referendos locais por iniciativa da câmara municipal, da assembleia municipal, da junta de freguesia, da assembleia de freguesia ou de 5 % dos eleitores;
. Permitir o acesso digital a todos os regulamentos locais às deliberações dos órgãos autárquicos e às propostas a submeter a apreciação ou a discussão pública;
. Criar um registo de interesses dos titulares de órgãos autárquicos.
Melhorar o serviço público local
O Governo irá:
. Abrir Lojas de Cidadão ou balcões multisserviços em todos os municípios, definindo o padrão mínimo de serviços públicos acessíveis em todos os concelhos;
. Definir o nível de serviço público obrigatoriamente disponível em todas as freguesias, a assegurar através de Espaços Cidadão ou de unidades móveis de proximidade;
. Estabelecer, através das entidades intermunicipais, um modelo de distribuição territorial dos serviços públicos dependentes da Administração central, de outras entidades públicas, de empresas públicas ou de concessionários de serviço público, definindo os níveis mínimos de acesso presencial ou digital a nível sub-regional.
Colocar o financiamento territorial ao serviço do desenvolvimento
O Governo irá:
. Aumentar, gradualmente, a participação das autarquias locais na gestão das receitas públicas, convergindo até 2025 para o nível médio dos países da União Europeia;
. Inscrever anualmente no Orçamento do Estado a evolução do nível de participação das autarquias locais nas receitas públicas, o qual deve ser monitorizado pela OCDE, Comité das Regiões e Conselho da Europa;
. Alargar a autonomia municipal na gestão das taxas e benefícios fiscais relativos aos impostos locais;
. Ampliar os critérios de territorialização da derrama sobre IRC;
. Consolidar a participação dos municípios na receita do IVA territorializado;
. Proceder a uma avaliação da adequação dos recursos financeiros transferidos para as autarquias locais ao exercício das novas competências descentralizadas, aferindo da eficácia e eficiência na gestão descentralizada dos recursos públicos.
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Investir na Habitação
O direito à habitação é um direito fundamental, indispensável para a concretização de um verdadeiro Estado Social. Ao longo de muitos anos, o Estado Social apostou no desenvolvimento de um Serviço Nacional de Saúde (SNS), na escola pública e num sistema de Segurança Social público, secundarizando-se as respostas sociais no âmbito da política de habitação. Neste domínio, a ação do Estado centrou-se fundamentalmente nas situações de extrema carência habitacional, praticamente não intervindo, em termos de resposta pública, na habitação para os grupos de médios e baixos rendimentos. É por isso hoje redobradamente importante assumir a habitação como um dos pilares centrais do Estado Social, apostando na efetivação de respostas integradas.
Estas respostas devem chegar não só aos grupos mais vulneráveis - como os casos de carência habitacional extrema e as necessidades específicas de determinadas faixas etárias, como sucede com os jovens (sobretudo nos aglomerados urbanos) e os mais idosos - mas também aos agregados com rendimentos baixos e médios que não encontram casa no mercado habitacional. A prioridade do Governo deve ser, por isso, a de intervir no mercado habitacional, constituindo para o efeito um parque habitacional público e cooperativo relevante, capaz de dar resposta no mercado de arrendamento.
É por isso importante dar continuidade e efetividade à política pública de habitação formulada através da definição de uma Nova Geração de Políticas de Habitação (NGPH), que permitiu estabelecer um impulso assinalável do setor na última legislatura. Não se trata portanto apenas de garantir uma habitação condigna para as pessoas com menores rendimentos mas, também, de assegurar que as classes médias podem aspirar a ter acesso a uma habitação condigna e evitar que a ausência de alternativas viáveis se torne num obstáculo à emancipação dos jovens.
Nestes termos, é vital fortalecer, aprofundar e concretizar as políticas recentemente adotadas, dando passos decisivos e relevantes para efetivar o reconhecimento constitucional do direito à habitação, fixando para o efeito uma meta muita clara: erradicar todas as carências habitacionais existentes no país até ao 50.º Aniversário do 25 de Abril, em 2024.
Renovar a aposta nas políticas de habitação
A Nova Geração de Políticas de Habitação veio conferir à política pública de alojamento um novo sentido estratégico, contemplando não só respostas às situações de maior desfavorecimento mas também à necessidade de assegurar o acesso à habitação para todos, agindo de modo mais consequente nos equilíbrios do mercado e introduzindo estímulos efetivos à recuperação do património habitacional e à regeneração e renovação urbanas.
Pelos défices acumulados, os desafios do país em matéria de cumprimento do direito à habitação são imensos, quer nos territórios das áreas metropolitanas, hoje sujeitas a uma pressão habitacional muito significativa e ao ressurgimento de fenómenos de exclusão associados à precariedade habitacional, quer nos espaços urbanos de menor dimensão ou mesmo nos espaços rurais. A política de habitação é hoje, portanto, uma política decisiva para a plena democratização do acesso ao bem-estar e para o próprio dinamismo e equilíbrio demográfico do país. Por isso, o Governo compromete-se a:
. Elaborar o Programa Nacional de Habitação, de acordo com a Lei de Bases da Habitação, definindo os objetivos, as metas e os recursos a alocar à política de habitação num horizonte de médio prazo;
. Apoiar a capacitação das autarquias em matéria de política de habitacional, mediante apoio técnico e financeiro para a elaboração das Estratégias Locais de Habitação, promovendo a informação, o conhecimento e o acesso aos programas e instrumentos de apoio à construção e reabilitação, reforçando a articulação e cooperação entre diferentes escalas de governação, neste âmbito e a sua adequação às especificidades locais garantindo uma resposta integrada à população;
. Promover a componente de cooperativismo na habitação, nomeadamente através da habitação colaborativa;
. Salvaguardar a previsibilidade e estabilidade na alocação de financiamento acrescido às políticas de habitação.
Erradicar as situações habitacionais indignas e a discriminação no acesso à habitação
Os resultados do Levantamento Nacional de Necessidades de Realojamento Habitacional de 2018 deixam claro que persistem carências habitacionais graves em Portugal, tendo sido identificados cerca de 26 mil agregados que vivem em condições habitacionais indignas.
Por esta razão, no âmbito da Nova Geração de Políticas de Habitação foi aprovado o «1.º Direito» - Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, que visa a promoção de soluções habitacionais para as famílias mais carenciadas e sem alternativa habitacional, cuja implementação continuada e sustentada importa garantir. Nesses termos, o Governo irá:
. Alocar ao Programa «1.º Direito» os recursos financeiros necessários para atingir o objetivo de erradicar todas as carências habitacionais até ao 50.º Aniversário do 25 de Abril, reforçando assim o parque habitacional público;
. Criar uma Bolsa Nacional de Alojamento Urgente, em cooperação com a Segurança Social, que, em complementaridade com a oferta pública de habitação e a ação municipal, assegure uma resposta temporária de recurso para as situações de emergência;
. Reforçar a garantia do direito à habitação da população mais vulnerável e a equidade de todos no acesso a este direito, com a regulamentação das condições e requisitos a cumprir em matéria de habitação adequada, de alternativa habitacional, de acesso aos apoios públicos e de proteção dos recursos mínimos de sobrevivência a ter em conta na aplicação dos apoios habitacionais;
. Intensificar a luta contra a discriminação no acesso à habitação, mediante o aumento da oferta pública especificamente orientada para os grupos mais vulneráveis e a sensibilização para o combate aos fenómenos de discriminação;
. Reforçar os instrumentos de participação dos cidadãos em matéria de política de habitação, em particular no processo de decisão e implementação de soluções habitacionais que lhes são destinadas, e apoiar as iniciativas cidadãs de base local.
Garantir o acesso à habitação a todos
O esforço financeiro do Estado na promoção direta de habitação pública tem sido centrado, de forma muito expressiva, na resolução das necessidades da população mais carenciada. É hoje evidente que o número de pessoas que enfrentam dificuldades em aceder a uma habitação adequada e com um custo comportável face aos seus rendimentos é muito mais alargado.
É também evidente que a total liberalização do arrendamento urbano efetuada em 2012 não se traduziu num aumento do arrendamento em geral, muito menos uma oferta de habitação a preços acessíveis e em condições de estabilidade. Assistiu-se sim ao agravamento e generalização das dificuldades de acesso à habitação por parte da população com rendimentos intermédios, que não consegue aceder a uma solução adequada de alojamento sem que isso implique uma forte sobrecarga sobre o seu orçamento.
Assim, é urgente reforçar os instrumentos de regulação do mercado, através da criação de um parque público para arrendamento a custos acessíveis. No entanto, dada a dimensão e urgência de atuação neste domínio, é necessário complementar a oferta pública de habitação com incentivos à disponibilização, por parte dos privados, de oferta habitacional para arrendamento, em condições de estabilidade e a custos abaixo do mercado. Neste domínio, o Governo irá:
. Criar um parque habitacional público de habitação a custos acessíveis, orientado para dar resposta aos agregados de rendimentos intermédios em situação de dificuldade de acesso à habitação, através da promoção direta e do apoio aos programas municipais;
. Reforçar a mobilização do património devoluto para o Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado, com vista à sua reabilitação e disponibilização para arrendamento habitacional a custos acessíveis;
. Incentivar a oferta privada de arrendamento a custos acessíveis, mediante a implementação do Programa de Arrendamento Acessível, a dinamização do regime de habitação a custos controlados, que dá acesso a uma taxa de IVA reduzida para a promoção habitacional a custos acessíveis, e o incentivo à redinamização do setor cooperativo;
. Reforçar o Porta 65 Jovem e compatibilizá-lo com o Programa de Arrendamento Acessível, visando assegurar a acessibilidade às habitações disponibilizadas aos jovens, que poderão beneficiar cumulativamente dos dois instrumentos de apoio;
. Incentivar soluções habitacionais que constituam alternativas à aquisição de habitação própria e deem resposta às necessidades dos grupos etários mais vulneráveis, nomeadamente através do direito real de habitação duradoura e da criação de condições para a sua disponibilização a custos acessíveis, juntamente com instrumentos de apoio ao seu acesso por parte das famílias.
Garantir a transparência e a segurança no acesso à habitação e a qualidade do parque habitacional
Assegurar o direito de todos à habitação implica, em especial num país como Portugal - em que o regime de casa própria tem um peso acima dos 70 % - garantir também a proteção dos direitos e interesses dos agregados familiares que investiram a maioria das suas poupanças na aquisição de casa própria. Adicionalmente, o regime jurídico da propriedade horizontal constitui um fator crítico para o acesso a uma habitação adequada com qualidade e segurança para uma parte relevante da população, até porque muitos dos edifícios sujeitos a este regime não se encontram em boas condições e podem apresentar riscos.
Importa ainda assegurar a qualidade construtiva global do parque habitacional, mediante a harmonização das regras aplicáveis à construção, o aprofundamento da integração de princípios de sustentabilidade ambiental e a qualificação do setor. Assim, o Governo irá:
. Criar um mecanismo de seguro ou garantia da construção, em articulação com os setores da construção e do imobiliário, dos seguros e dos consumidores e proprietários, que cubra a responsabilidade por defeitos de construção em caso de insolvência do construtor;
. Criar melhores condições para a reabilitação e conservação regular dos edifícios em propriedade horizontal;
. Codificar as normas técnicas da construção, permitindo diminuir a extensão, dispersão, fragmentação e complexidade do quadro regulamentar;
. Incentivar modelos de negócio que possam dar resposta ao mercado da reutilização, bem como as ferramentas que lhe são inerentes;
. Desencadear mecanismos de promoção da qualidade da construção, e em particular da reabilitação do parque edificado existente, através de estratégias de monitorização, incentivo e valorização das boas práticas;
. Incentivar a integração da análise do ciclo de vida dos edifícios na determinação dos custos de construção;
. Criar mecanismos que permitam aos consumidores e donos de obra conhecer as qualificações específicas de cada empresa, de modo a que a sua opção possa ser feita tendo em conta a aptidão para a obra em causa.
Conceber a habitação como instrumento de inclusão social e de coesão territorial
Garantir o acesso a condições habitacionais dignas para todos, seja em regiões metropolitanas, urbanas ou rurais, constitui um fator da maior importância no fomento da coesão socioterritorial e na promoção da qualidade de vida e do direito a um desenvolvimento sustentável e equilibrado do país. Para corrigir as fortes assimetrias territoriais que se verificam neste âmbito, e que têm conduzido, ao longo dos anos, ao envelhecimento e desertificação dos territórios do interior (concomitante com a concentração de pessoas nas áreas metropolitanas), bem como para facilitar a mobilidade dos agregados familiares entre os diferentes territórios e segmentos de oferta habitacional, o Governo irá:
. Facilitar a mobilidade habitacional e territorial, através da implementação do programa Chave na Mão e criação de condições de mobilidade habitacional no parque de arrendamento público;
. Implementar o programa Reabilitar para Povoar, com o objetivo de alargar a oferta de habitação nos territórios do interior a preços acessíveis e apoiar os agregados familiares em matéria de acesso à habitação;
. Promover a reconversão de territórios críticos e complexos, como as áreas de génese ilegal e de construção informal, mediante a eliminação dos aspetos que obstaculizem ou dificultem a sua resolução e a mobilização dos apoios financeiros disponíveis para este fim;
. Implementar as conclusões do Programa «Da Habitação ao Habitat», visando a promoção da coesão e da integração socioterritorial dos bairros de arrendamento público, e a melhoria global das condições de vida dos seus moradores;
. Fortalecer o acompanhamento integrado e de proximidade, através da qualificação dos serviços e entidades locais com competências na área habitacional e social, do apoio a associações de moradores e da plena integração da temática da habitação e das entidades - com responsabilidade nesta matéria - nos Conselhos Locais de Ação Social e na Rede Social.
O diploma encontra-se disponível para consulta através do link: LEI N.º 3/2020